quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

O menino setentista


Edição e revisão: Marsel Botelho


                                                                        Ele canta com a mesma intensidade que respira



        Poeta, cantador, embolador, repentista e menino em erupção plena, Alceu Paiva Valença, no auge dos seus 70 anos, nos brinda com o DVD/CD “Vivo! Revivo!” Gravado ao vivo nos dias 8 e 9 de outubro de 2015 no belíssimo Teatro Santa Isabel na Capital pernambucana e recém-lançado pelo selo Canal Brasil. Alceu revive os três primeiros álbuns de sua carreira de 43 anos, literalmente vitoriosa. Os arranjos têm o mesmo conceito do das gravações originais das canções: guitarra, baixo, violões, viola, flautas, pífanos, percussão e bateria (até o tom em que canta é o da gravação original). A banda é formada por Cassio Cunha, Cesar Michiles, Leo Stegmann, Nando Barreto, Jean e por seu fiel escudeiro desde a primeira viagem, Paulo Rafael.

       Das 15 faixas, as quatro primeiras músicas são do álbum “Espelho Cristalino” de 1977. O “show” começa com o eletrizante “rock” “Agalopado” (A.V), que traz versos assim: “Quando eu canto o seu coração se abala/Pois eu sou porta-voz da incoerência/ Desprezando seu gesto de clemência/Sei que meu pensamento lhe atrapalha.” Na sequência, ouviremos o maracatu “Anjo de Fogo” (A.V). Em “Veneno” (Alceu Valença/Rodolfo Aureliano), os versos poéticos avassaladores dizem: “Aprendi com a chuva/Você não quis me ensinar/Fiz toalha do sol também/Você não quis me enxugar/Eu fui jogado entre feras/Olho por olho é a lei/Qualquer dia eu enfrento sua guerra/E minhas balas têm hortelã /Eu sou a terrível febre amarela/E o veneno da cobra e da maçã.” O público vai ao delírio com Espelho Cristalino” (A.V): eu me emocionei com os versos do folclore nordestino, que me remetem aos cantadores e emboladores das feiras pernambucanas. A capa desse LP é uma foto-composição de Virgulino Lampião na própria feição de Alceu, criando uma similitude proposital entre artista e cangaceiro.

          Alceu abre a segunda parte do “show” e ele mesmo o chama de psicodelia romântica. O disco contemplado é “Molhado de Suor” de 1974. As canções “Dia Branco”, “Mensageira dos Anjos” e “Dente de Ocidente” mostram as multifacetadas ilhas de poesia de Valença no seu mar de pura calmaria, até ele se entregar a uma viagem solitária no palco com seu violão no repente psicodélico “Punhal de Prata” (A.V). Fechando o álbum, de 1974 ouviremos a emblemática “Papagaio do Futuro”.

            Alceu é um redemoinho e encanta todos com suas travessuras e mugangas, ziguezagueando o palco, fazendo suas típicas caretas e carrapetas e nos envolvendo com seus causos poéticos. Alceu se presenteia com esse DVD/CD e nós somos convidados a embarcar nesse trem que saiu de São Bento do Una (PE) no dia 1 de julho de 1946 para as estações de todo o mundo. A terceira e última parte do “show” contempla o disco “Vivo” de 1976 e nos leva a um denso imaginário nos temas: “Descida da Ladeira”, “Pontos Cardeais”, “Casamento da Raposa com o Rouxinol”, “Edipiana NR01” (Alceu Valença/Geraldo Azevedo) e “Você Pensa”. No arrremate final, ouviremos “Sol e Chuva”. Alceu é tempestade na calmaria, é baião, frevo, maracatu, todo nosso rico caldeirão cultural fervilhando. 

           




Nenhum comentário:

Postar um comentário