Agradecimentos especiais a Patrícia Chammas
Duas décadas de música e poesia são celebradas em “Rimanceiro” (Biscoito Fino), sétimo álbum do cantor mineiro Sergio Santos que tem suas melodias emolduradas pela poesia do mito Paulo César Pinheiro. O CD apresenta 14 canções, sendo12 inéditas. Totalmente acústico e produzido por Gabriel Pinheiro, Santos divide com Silvio D'Amico os violões.
Aqui, a fauna, a flora e as águas do sertão de Guimarães Rosa ganham vida e nos fazem trilhar por suas veredas. Em tempos da mutilação da música e poesia por mídias excludentes, ouvir Rimanceiro é ter a certeza de que um outro Brasil, à música de verdade, sobrevive. Vamos juntos nos embrenhar nas melodias poéticas desse grande sertão brasileiro, começando por “Aço e Seda”. Os cheiros, sabores e aromas da Chapada Diamantina vêm através dos dois mestres citados: Paulinho Pedra Azul e Saulo Laranjeira. A segunda canção me remete aos mestres Dominguinhos, Sivuca e Luiz “Lua” Gonzaga, o singular baião “Cabeça Chata”. Ouço nessa pisada o som dos seus foles.
A poesia da bela canção “Bandeira” é dedicada às cores e à raça de um povo. “Bandeira verde e amarela/Azul e branca bandeira/Raça de cravo e canela/De nome feito em madeira”. Quem de nós já não sofreu por amor? Quantos corações dilacerados encontramos nas sendas da vida. É com uma chuva de lirismo que a música “Coração do Mato” descreve as mágoas de amor, mas, aqui, temperadas de esperança. O convite agora é para mergulhar na pureza da melodia interiorana: o poeta foi buscar nas suas nascentes as palavras certas para acariciar nossos ouvidos em “Canto da Água”. Doze anos se passaram da primeira gravação de “Ganga-Zumbi” no CD Áfrico (Biscoito Fino) e, a cada interpretação, a música ganha mais corpo. Lindo demais...
A canção que da título a esta obra de arte, “Rimanceiro”, define bem a comunhão de 20 anos entre música e poesia. Nela, o poeta diz: “Tenho muitos versos/Basta me pedires/Sei de um pote cheio/No fim do arco-íris”. Para o nosso bem, que outros 20 sejam comemorados! Uma das músicas que me comovem é “Jagunço”. Ela defende ser o amor capaz de habitar até o mais rude dos homens. Aqui, Santos e Pinheiro desvendam a braveza delicada do homem quem se embrenha na poesia do mato. A África é lembrada mais uma vez em “Kêkêrêkê”, gravada anteriormente em Áfrico, de 2002. Saindo um pouco do sertão Roseano, o artista celebra as tradições indígenas em “Putirum”.
Foram duas décadas de espera para ser gravada a primeira composição entre Sergio Santos e Paulo César Pinheiro, “Onça Pintada”. Isso nos prova que tudo tem sua hora. As vozes do sertão se ouvem em “Voz da Noite, Voz do Dia”. Quem mora em grandes metrópoles pouco consegue ver as constelações que brilham no céu. Em “Quatro Estrelas” a música nos apresenta as do norte, a cadente, a do sul e a do mar, permitindo-nos viajar a cada nota.
“Chama-se tempo esse menino forte/E a costureira, pois, chama-se Morte/E o velho cego, então, chama-se Deus” – trecho da poética “Vidência”, que fecha em grande estilo essa audição.
A dupla já totaliza mais de 250 canções. Sergio, Paulo, música e poesia. Para Sempre.
Li o artigo ouvindo "Litoral e interior" dele, já que a Biscoito Fino, ao contrário da Kuarup, não permite ouvir os discos. Parece que depois de João Nogueira, Paulo César Pinheiro encontrou outra alma gêmea.Parabéns pelo artigo e pelo sofisticado gosto musical, Dery.
ResponderExcluirÉ sempre reconfortante saber que, em meio à mediocridade que corre solta em nossa mídia, há gente boa fazendo música séria neste nosso país.
ResponderExcluirParabéns, Dery, pela escolha.